O Solar do Unhão, que hoje abriga o Museu de Arte Moderna da Bahia, em Salvador, teve vários usos e proprietários até ser tombado pelo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, em 1943. No século XVI, esse pedaço de terra à beira-mar pertenceu aos monges do Mosteiro de São Bento e, no século seguinte, ao desembargador Pedro Unhão Castelo Branco, que construiu o solar que até hoje leva seu nome. No início do século XVIII, a propriedade passou para a família de José Pires de Carvalho e Albuquerque, que construiu ali a capela, o chafariz e os painéis de azulejos portugueses que ainda hoje podem ser apreciados na entrada do solar.

Vue de la Rade de Bahia prise du Jardin public. A la fabrique de tabac de M. M. de Meuron e Cie

Por volta de 1820, a propriedade foi arrendada ao empreendedor suíço Auguste Frédéric Meuron (1789-1852), que transferiu para o local sua fábrica de rapé Areia Preta, anteriormente situada no atual bairro de Ondina, também em Salvador. De uma família rica de comerciantes, Meuron chegou à Bahia em 1817 e logo abriu sua manufatura de rapé, que concorria com o rapé Princesa de Lisboa, importado de Portugal.

O rapé, um dos mais antigos produtos industriais, é uma mistura de fumo em corda ou em folhas, processado para se tornar um pó que é aspirado. Assim como o tabaco, era utilizado pelos povos indígenas em diversos rituais espirituais e de cura, bem antes da chegada dos europeus na América. Tornou-se uma febre na Europa e também aqui na colônia, até começar a ser lentamente preterido pelo charuto, já no final do século XIX.

O rapé produzido no Brasil costumava misturar fumo em corda nacional com folhas de fumo da Virgínia, importado dos Estados Unidos. A Bahia começou a produzir fumo por volta de 1570, e o produto foi durante bastante tempo um dos mais importantes da economia colonial. O processo de fabricação do rapé era longo, envolvia várias etapas e utensílios como fornos, pilões, peneiras e demandava bastante espaço de secagem. Para colocar sua fábrica em funcionamento, Meuron fez algumas mudanças na propriedade, construindo um segundo andar no solar e dois galpões no terreno na beira do mar.

A produção da fábrica na Bahia cresceu em pouco tempo, Meuron se tornou um dos principais produtores de rapé no Brasil e abriu filiais no Rio de Janeiro, no bairro do Andaraí, e de Chora Menino, no Recife. Por volta de 1860, havia no Brasil onze fábricas de rapé, cinco na Bahia e seis no Rio de Janeiro.

Fábrica Meuron no Andaraí, Rio de Janeiro

Nesta pintura (acima) do suíço Jean-Jacques François Coindet (1800-1857), encomendada por Meuron na década de 1840, podemos ver a filial da fábrica de rapé no Rio de Janeiro, fundada em 1832.

Uma das curiosidades que envolve a fábrica Meuron foi a queixa-crime aberta pelo então jovem advogado baiano Ruy Barbosa (1849-1923), em 1874, contra a concorrente, Moreira & Cia., que passou a produzir o Rapé Areia Fina, em uma embalagem muito semelhante a do Rapé Areia Preta. Ruy Barbosa venceu em primeira instância e conseguiu que fossem apreendidos mais de 2.300 botes do rapé da concorrência. Mas naquele tempo não existia no país o delito de violação de marca e a fábrica Moreira & Cia acabou reconquistando seu direito de fabricação.

Depois da morte de Meuron, em 1852, a fábrica foi herdada pelos irmãos franceses Edouard e Antoine Borel, que eram seus parentes por casamento. A partir de 1892, a fábrica passou a se chamar Fumos e Rapé de Borel e Cia., e já estava produzindo também cigarros que a essa altura já tinham ultrapassado o rapé na preferência dos consumidores. Por volta de 1925, em decadência, a fábrica Borel fechou, mas entrou para sempre na história do Rio de Janeiro, por ter batizado com seu nome o lugar onde se localizava, o hoje famoso Morro do Borel.