O pintor, desenhista e gravador holandês Pieter Godfried Bertichen (1796 -1866) publicou no Rio de Janeiro, em 1856, o álbum O Brasil pitoresco e monumental - O Rio de Janeiro e seus Arrabaldes, com 47 gravuras, que podem ser vistas aqui na Brasiliana Iconográfica. Bertichen chegou ao Brasil em 1837 junto com sua esposa Susana Berendina e o casal passou a morar no Rio de Janeiro. Em 1845 e 1846, o artista participou da Exposição Geral de Belas-Artes, e recebeu a Medalha de Ouro pela pintura Vista da cidade do Rio de Janeiro observada da Ilha dos Ratos (1845).
A história de Bertichen não é muito conhecida. Segundo o tradicional dicionário de artes francês Benezit, o pintor teria participado de exposições em Amsterdam entre 1814 e 1832. Os motivos que o trouxeram ao Brasil são desconhecidos, mas viveu aqui entre o Rio de Janeiro e Petrópolis, onde faleceu em 1866.
A partir dos anos de 1840, houve uma expansão na produção de álbuns de gravuras no Brasil. Essas publicações, que retratavam a capital do Império, tinham bastante sucesso na Europa e também no Rio de Janeiro, onde um potencial mercado consumidor de gravuras começava a crescer. Bertichen se aproveitou desse desenvolvimento para publicar o seu, em parceria com seu conterrâneo, o litógrafo Eduard Rensburg, estabelecido no Brasil desde 1839 e que havia se separado há pouco de seu sócio inglês, George Mathias Heaton, e montado seu próprio negócio.
O álbum de Bertichen teve mais de uma edição. A primeira de 1856, intitulada Brazil Pitoresco e Monumental, tinha 46 gravuras e textos do poeta e jornalista português Augusto Zaluar. No ano seguinte, uma nova edição foi feita com o título de Rio de Janeiro e seus arrabaldes. Entre uma e outra, foi publicada esta, que juntava os dois títulos e faz parte do acervo da Coleção Brasiliana Itaú.
É curioso observar que em todas as vistas do álbum, exceto na capa interna (acima), há a presença de figuras humanas. Lançada durante o Segundo Reinado (1840-1889), a obra de Bertichen tenta mostrar um Rio de Janeiro "civilizado", ou menos pitoresco e mais monumental, onde as imagens da natureza dão lugar às da urbanização, em que as construções e o homem estão sempre presentes. Mesmo nas duas únicas gravuras de paisagens, como a Floresta Virgem e a Mãi d'Água (morro de Sta. Thereza), há pessoas interagindo com elas.
O álbum dá destaque para prédios públicos como o hospital, o museu, a câmara, o hospício, a escola militar, o arsenal da Marinha, o Banco do Brasil, os colégios, em construções que até hoje, em sua maioria, ainda existem no Rio de Janeiro, apesar de terem ganhado outras funções e novas vizinhanças.
Também as construções religiosas são bastante retratadas e, assim como os prédios públicos, são frequentadas por cavalheiros distintos de chapéu e paletó e senhoras bem vestidas.
Os escravizados são pouco representados, embora numerosos. Como escreve o historiador Luiz Felipe de Alencastro no segundo volume da História da Vida Privada no Brasil - Império: a Corte e a Modernidade Nacional (Companhia das Letras, 1997), "tamanho volume de escravos dá à corte as características de uma cidade quase negra e _na sequência do boom do tráfico negreiro nos anos 1840_ de uma cidade meio africana". Não é a impressão que se tem no álbum de Bertichen e, nas poucas gravuras em que os escravizados estão representados, eles aparecem sempre carregando algo na cabeça.